segunda-feira, 13 de setembro de 2010

PRESOS SARAUÍS DE SALÉ: CARTA ABERTA AO PRESIDENTE DO PARLAMENTO EUROPEU


Carta Aberta

Ao Presidente do Parlamento Europeu

09.09.2010

Exmo. Senhor Jerzy Buzek


Somos um grupo de defensores sarauís dos direitos humanos, que sofremos na pele, em muitas ocasiões, diferentes experiências de rapto e detenção como presos políticos, devido às nossas opiniões e/ou actividades como activistas dos direitos humanos, sindicalistas e intervenientes activos da sociedade civil. Devido a tudo isto, alguns de nós receberam prémios importantes em reconhecimento da nossa luta e defesa pró-activa dos direitos humanos.

No dia 8 de Outubro de 2009, ao regressarmos de uma visita de natureza humanista aos campos de refugiados sarauís no Sudoeste da Argélia, fomos detidos dentro do aeroporto Mohamed V, em Casablanca, pela Polícia Criminal marroquina, com a participação de outras unidades da polícia de segurança e da polícia secreta marroquinas. Fomos submetidos a interrogatórios durante oito dias e sofremos abusos e maus tratos vários que não podem ser descritos em pormenor nesta carta.

Subsequentemente, fomos levados à presença do Juiz Examinador do Tribunal Militar Marroquino, em Rabat, um passo que só pode ser considerado como uma decisão muito perigosa. O Juiz Marroquino sentenciou-nos a prisão preventiva e enviou-nos para a prisão local de Salé no dia 15 de Outubro de 2009.

Senhor Presidente,

No dia 28 de Janeiro de 2010, a nossa camarada, Ms. Degja Lechgar, foi libertada condicionalmente e, de forma análoga, outros três camaradas, Mr. Yahdih Terrouzi, Mr. Saleh Lebeihi e Mr. Rachid Sghair, foram igualmente libertados no dia 18 de Maio de 2010 depois da nossa greve de fome partilhada por todos ao longo de 41 dias.

Pusemos fim à greve de fome depois de termos recebido garantias das autoridades marroquinas de que o nosso caso ia ser resolvido. No entanto, apesar de todos os apelos reiterados de organizações de direitos humanos marroquinas e internacionais e de instituições governamentais e parlamentares de muitos países que exigiam a nossa libertação imediata e incondicional, o governo marroquino manteve-nos em prisão preventiva, demonstrando assim a sua relutância em nos levar a tribunal ou em libertar-nos. Esta atitude só pode ser considerada uma atitude anómala e ilegal que contradiz o direito internacional, o qual garante o direito a um julgamento justo dentro de um período de tempo razoável. Ora, Sr. Presidente, já passámos mais de 11 meses na prisão sem qualquer julgamento.

Senhor Presidente,

A nossa visita aos campos de refugiados sarauís, que só pode ser enquadrada por aquilo que o direito internacional e as convenções internacionais classificam como um exercício de liberdade de movimentos e de expressão pacífica, resultou na nossa detenção e incriminação com acusações vagas e pesadas, numa tentativa de dar conotações criminais ao nosso caso e também numa tentativa espalhafatosa de o desviar da sua natureza real. Esta atitude atesta bem a maneira como a polícia do governo marroquino é caracterizada por preocupações políticas e de segurança que visam oprimir e atingir os defensores dos direitos humanos sarauís que exprimam abertamente as suas opiniões políticas contra as propensões do regime de Marrocos no que diz respeito à questão do Sara Ocidental. O que torna esta abordagem ainda mais estranha é o facto de mais de 60 defensores dos direitos humanos sarauís terem feito a mesma viagem aos campos de refugiados sarauís em sucessivas ocasiões.


Surpreendentemente, a sua acção não foi objecto dos mesmos procedimentos jurídicos nem dos mesmos interrogatórios, embora fossem molestados e vexados de várias maneiras. Por conseguinte, consideramos que o regime de Marrocos não tem mais argumentos disponíveis para nos manter em cativeiro.

Senhor Presidente,

A detenção ilegal a que estamos sujeitos constitui uma violação muito pequena quando comparada com a natureza e a quantidade de violações grosseiras cometidas no Sara Ocidental. Existem relatórios de organizações de direitos humanos marroquinas e internacionais sobre estes abusos, mas Marrocos ignora simplesmente as queixas e protestos das vozes democráticas internacionais.

Neste aspecto, Rabat tem também demonstrado muito pouco respeito pelo seu parceiro geopolítico e económico, a União Europeia, que é conhecida por advogar persistentemente o respeito pelo direito internacional e pelos direitos humanos em todo o mundo. O estatuto avançado de parceria concedido a Marrocos falhou na sua missão de convencer Rabat a pôr fim às suas políticas opressivas e não conseguiu que o país alinhasse mais com as normas e elevados padrões europeus no tocante aos direitos humanos. Em vez disso, a concessão de um estatuto superior tem sido usada pelas autoridades marroquinas como uma capa que serve para esconder as repetidas e clamorosas violações dos direitos humanos.

É preocupante que a União Europeia permita que a sua imagem seja manchada por Marrocos. Nada é mais óbvio do que o caso do acordo no domínio das pescas, em que a União Europeia se tornou cúmplice do roubo ilegal dos recursos naturais do povo sarauí. Tal como foi estipulado no Parecer Jurídico das Nações Unidas sobre esta matéria, em 2002, e repetido no Parecer Jurídico do Parlamento Europeu de 2009 sobre o acordo supracitado, os recursos sarauís só podem ser retirados do território de acordo com os desejos e interesses do povo sarauí. Senhor Presidente, a nossa voz nunca foi ouvida neste empreendimento e o único resultado do acordo de pescas que o nosso povo tem notado é que as nossas vozes são cada vez mais reprimidas, já que Marrocos se sente apoiado pela União Europeia nas suas pretensões infundadas e ilegais sobre a nossa pátria. Uma vez que o povo sarauí não concordou nem beneficia deste acordo, como é exigido à luz do direito internacional, exigimos que cessem imediatamente todas as pescas europeias em águas sarauís.

Finalmente, apelamos a Vossa Excelência que pressione Marrocos no sentido de nos levar a tribunal, num julgamento justo na presença de observadores internacionais ou de nos libertar simultaneamente com todos os defensores de direitos humanos sarauís e todos os presos de consciência que se encontram nas prisões marroquinas.

Com os melhores cumprimentos

de: Os três defensores sarauís dos direitos humanos e presos de consciência
Ali Salem Tamek 50010, Brahim Dahan 50014 and Hamadi Naciri

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